sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Pacto de Sangue

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Pacto de Sangue (Double Indemnity, 1944)

Estreia oficial: 24 de abril de 1944
IMDb



Ao dirigir seu terceiro filme nos Estados Unidos, Billy Wilder já cria uma obra-prima não só do gênero noir, mas do cinema como um todo. Este "Pacto de Sangue" representa um dos primeiros filmes a adotar o estilo visual que, posteriormente, caracterizaria os famosos filmes noir, com sua fotografia preta-e-branca bem contrastada e bastante uso de sombras (numa nítida influência dos filmes expressioanistas alemães), além da trama ambientar-se quase que exclusivamente à noite e tratar de personagens de moral um tanto quanto duvidosa.

O roteiro, escrito pelo próprio Wilder em parceria com Raymond Chandler, baseado no romance de James M. Cain, narra a história de um corretor de seguros, Walter Neff (Fred MacMurray), que acaba envolvendo-se com a esposa de um cliente, a sedutora e misteriosa Phyllis Dietrichson (Barbara Stanwyck). Logo ela convence-o a participar de um plano para assassinar seu marido. Utilizando-se dos seus conhecimentos acerca das apólices de seguros e das investigações futuras, Neff acredita ter bolado o crime perfeito afim de que tudo pareça um acidente e Phyllis receba a tal indenização dobrada do título original. Porém, para isso, eles terão que enganar o colega de trabalho de Neff, o desconfiado e extremamente inteligente, Barton Keyes (Edward G. Robinson).

Possuindo uma das características marcantes do cinema noir, "Pacto de Sangue" inicia com uma narração em off do próprio Neff, que, já de cara, admite ter matado o Sr. Dietrichson. Devo confessar que nou sou das mais fãs de narração em off, porém, aqui, ela funciona como fio condutor da história. Nada daqueles comentários que apenas reiteram o que as imagens já estão dizendo. O texto de Wilder e Chandler serve não apenas para ambientar a ação, mas também para complementar a personalidade do protagonista. Ao narrar sua história, Neff também vai, aos poucos, revelando seu caráter e seus sentimentos.

Aliás, a composicão dos personagens talvez seja o ponto alto do roteiro, criando indivíduos tridimensionais e, acima de tudo, extremamente complexos e enigmáticos. E, se ao longo do filme vamos descobrindo quem é Walter Neff, sua fascinação por aquela mulher sedutora, sua frieza, e seu posterior arrependimento; ao mesmo tempo em que somos brindados com o raciocínio sempre rápido e sagaz de Keyes, juntamente com sua inquestionável moral; o mesmo não se pode dizer de Phyllis. Desde o momento em que aparece pela primeira vez na tela, sabemos que aquela mulher não é quem aparenta. Sempre dissimulada e manipuladora, ela nunca revela seus verdadeiros sentimentos e pensamentos. Até no clímax do filme, quando ela e Neff confrontam-se e ela lhe diz: "Não, eu nunca te amei, Walter - nem você, nem ninguém. Eu te usei, assim como você acabou de dizer. Foi tudo o que você significou pra mim. Até há um minuto, quando eu não consegui disparar o segundo tiro", ao que ele responde: "Desculpe, querida, não estou acreditando". Nem ele, nem nós, espectadores. E acho que nem mesmo a própria Phyllis acredita no que acabou de dizer. E é essa femme fatale traiçoeira que é a força motriz do longa de Wilder.

Claro que muito da força destes personagens deve-se à brilhante atuação de seus atores. Edward G. Robinson, com seu jeito bonachão, dá o tom certo de moralidade a uma história repleta de personagens amorais; Fred MacMurray esbanja virilidade e um jeito 'durão'; mas é mesmo Barbara Stanwyck que cria a personagem mais fascinante do longa, e quiçá, da história do cinema. Não há como descrever Phyllis em palavras, só vendo-a para ter completa noção do que essa mulher seria capaz de fazer.

Como não poderia deixar de ser em um filme de Wilder, sua direção é sempre segura e imprime um ótimo ritmo à narrativa, além de manter, constantemente o clima de urgência e suspense que a história pede. Os diálogos, é claro, são sempre rápidos e repletos de insinuações e duplos sentidos, bem ao estilo do cineasta; além de, vez ou outra, conterem um quê de humor e sarcasmo, mesmo num contexto tão tenso e denso.

Para finalizar, há ainda a excelente fotografia de John F. Steitz, com alto contraste e sombras bem demarcadas, como falei, bem ao estilo noir. E a ótima trilha musical de Miklós Rózsa, que intensifica o clima de suspense e desconfiança de toda a narrativa.

Enfim, acho bastante difícil escolher 'o' melhor filme de Billy Wilder, mas "Pacto de Sangue" certamente entrará no 'top 5' da lista de qualquer espectador. Mais do que isso, é um dos melhores filmes do gênero noir já realizados.

Fica a dica!


por Melissa Lipinski


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