quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Contágio

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Contágio (Contagion, 2011)

Estreia oficial: 9 de setembro de 2011
Estreia no Brasil: 28 de outubro de 2011
IMDb



"Contágio", de Steven Soderbergh, estruturalmente lembra muito um outro filme do diretor - "Traffic" (de 2000), acompanhando várias linhas narrativas e uma porção de personagens. Porém, diferentemente do seu longa de 11 anos atrás, "Contágio" não consegue desenvolver bem seus personagens, e assim, falha no ponto onde "Traffic" era muito bem sucedido: no quesito humano.

Dito isto, devo falar que "Contágio" é muito eficiente narrativamente: transita entre as várias frentes da trama com uma edição ágil e super competente, que dita o ritmo do filme sem nunca comprometer seu entendimento.

Assim, acompanhamos uma epidemia causada por um vírus desconhecido, altamente letal a seres humanos. De um lado, os indivíduos que contraíram tal vírus e passam-no adiante. De outro, cientistas em busca da identificação deste vírus e de sua cura. E ainda, os aspectos sociais, políticos e econômicos envolvidos, assiim como o papel da mídia nisto tudo.

E, se Soderbergh acerta quando foca sua história na busca pelo agente patogênico e no desespero em tentar contê-lo; falha nas outras frentes. Assim, toda vez que os cientistas entram em cena, o filme torna-se mais interessante.

O fato de colocar vários (são realmente muitos!) personagens, faz com que não haja tempo o suficiente para desenvolvê-los corretamente, assim, acontece o que falei no primeiro parágrafo: o fator humano é totalmente prejudicado, já que não nos importamos realmente com aquelas pessoas que estamos acompanhando.

Assim, o filme beneficia-se pelo fato de utilizar bons atores já conhecidos pelo público, pois, mais do que desenvolver seus personagens dentro do filme, passamos a identificá-los pelos 'tipos' que estamos acostumados. Assim, sabemos que Matt Damon é um 'bom moço'; Marion Cotillard empresta uma doçura à sua personagem; Laurence Fishburne, força e determinação; e assim por diante. Kate Winslet, tendo mais tempo em tela, acaba ganhando mais a nossa afeição. Note-se que não estou desmerecendo o trabalho desta atriz, a quem muito admiro, ou qualquer outro ator do filme, apenas constatando que não houve tempo hábil para construir personagens que não passassem de estereótipos. Assim, não é de estranhar que Jude Law use uma prótese dentária para 'enfeiá-lo', e causar certo desconforto ao espectador, já que é exatamente esta a personalidade do seu jornalista.

Já que falei em jornalista, devo dizer que o filme peca terrivelmente em não explorar melhor o papel da mídia na história. Quase que ignorando o papel que a televisão certamente ocuparia em uma epidemia deste nível, o roteirista Scott Z. Burns preferiu concentrar-se na internet e no papel 'nocivo' que ela teria em uma situação como esta. É decepcionante que usem a rede apenas como propagadora de boatos, mentiras e especulações, aumentando a neurose da população, e não como divulgadora rápida de informações. Assim, o 'vilão' do filme (além do vírus mortal, é claro; e de Gwyneth Paltrow) passa a ser um jornalista-blogueiro (Law).

O grande número de personagens e tramas paralelas também prejudica o desenlaçar de toda a história. Assim, a narrativa que acompanha Marion Cotillard é praticamente esquecida em boa parte da trama, para apenas ser retomada em seu final - devo dizer, aqui, que sua parte da história é tola o bastante para ser desnecessária ao desenrolar do restante do filme.

Depois de mostrar a morte de várias pessoas, a destruição e pilhagem de cidades, passar (mesmo que superficialmente) pelo comportamento 'bestial' que toma conta dos seres humanos em condições de desespero, "Contágio" aposta em um final desnecessário, explicativo demais, e 'feliz', como que querendo passar uma boa sensação ao espectador ao final do filme. Bom, a única sensação que tive foi essa: um filme bem realizado, com ótimo elenco… Mas, infelizmente, esquecível.


por Melissa Lipinski


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