segunda-feira, 31 de outubro de 2011

O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei, O (The Lord of the Ring: The Return of the King, 2003)

Estreia oficial: 17 de dezembro de 2003
Estreia no Brasil: 25 de dezembro de 2003
IMDb



Peter Jackson fecha com chave de ouro a sua trilogia do Anel, adaptação dos livros homônimos de J. R. R. Tolkien. Este último filme, "O Retorno do Rei", é o mais regular dos três, principalmente no que diz respeito ao ritmo de sua narrativa. E, o principal problema de "As Duas Torres" não volta a se repetir aqui, já que Jackson consegue transitar entre as diferentes linhas narrativas de forma fluida, sem perder o ritmo e aumentando ainda mais a sensação de expectativa e tensão do espectador.

Novamente a equipe técnica se supera e cria uma batalha ainda mais surpreendente do que as vistas nos filmes anteriores. Se a batalha do Abismo de Helm era melhor do que aquela vista no início de "A Sociedade do Anel" durante o prólogo que explicava o surgimento do Um Anel; agora, a guerra travada nos Campos de Pelennor, em Gondor, é ainda superior em escala e em qualidade técnica.

Dirigindo com maestria as cenas de ação, Peter Jackson intercala grandes planos abertos (muitos deles aéreos e que mostram a amplitude daquela batalha) e planos fechados (que mostram os esforços e sofrimento dos seus combatentes), dando bastante vigor a essas cenas, o que aumenta ainda mais a adrenalina do público; e que é coroada pela brilhante trilha musical de Howard Shore.

Mais uma vez superando-se no quesito técnico, a equipe de computação gráfica de "O Senhor dos Anéis" não só gera milhares de combatentes virtuais, como cria criaturas bastante 'reais', como a gigantesca Laracna, os espíritos da Senda dos Mortos e, claro, Gollum, que volta mais convincente do que em "As Duas Torres".

Gollum, inclusive, confirma o que já havia prenunciado no segundo capítulo da trilogia: como o personagem mais complexo e trágico de toda a narrativa. E, inteligentemente, ao mostrar Sméagol (Andy Serkins) antes de ser dominado pelo Anel, Peter Jackson não só consegue humanizá-lo (ou "hobbitizá-lo", não resisiti!), mas também reafirma o grande poder maligno do Anel, o que já vinha se desenhando desde a primeira cena de "A Sociedade do Anel".

Mas, o grande mérito do filme de Jackson, sem dúvida, é não menosprezar o caráter de seus heróis (o que acontecia, em parte, em "As Duas Torres"). E assim, além de emocionantes sequências de ação, o cineasta também encontra tempo para melhor desenvolver seus personagens. Desde a loucura do regente Denethor (John Noble); passando pela dor de Elrond (Hugo Weaving) ao ver sua filha, Arwen (Liv Tyler), renunciar à imortalidade para ficar ao lado do homem que ama; a força que Aragorn (Viggo Mortensen) reencontra assumindo o seu lugar como rei do Homens; a coragem de Eowyn (Miranda Otto); a liderança de Gandalf (Ian McKellen), que finalmente torna-se um mago verdadeiramente poderoso (e tão gentil quanto temível); o conflito interno de Gollum; até chegar aos grandes heróis dessa épica história: os pequeninos hobbits. E, auxiliado pelo excelente trabalho de seu elenco, Jackson consegue mostrar os enormes sacrifícios que Merry (Dominic Monaghan), Pippin (Billy Boyd), Sam (Sean Astin) e Frodo (Elijah Wood) tiveram de fazer para poderem salvar o 'Bem'. Frodo e Sam principalmente, que (até mesmo visualmente) jamais seriam os mesmos.

Enfim, "O Retorno do Rei" fecha a trilogia de forma espetacular, adaptando de forma primorosa a detalhista obra escrita por J. R. R. Tolkien. Já é um clássico do Cinema, e uma das melhors trilogias já realizadas.

Fica a dica!


por Melissa Lipinski


domingo, 30 de outubro de 2011

O Senhor dos Anéis: As Duas Torres

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Senhor dos Anéis: As Duas Torres, O (The Lord of the Ring: The Two Towers, 2002)

Estreia oficial: 18 de dezembro de 2002
Estreia no Brasil: 27 de dezembro de 2002
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"As Duas Torres", segundo filme da trilogia do Anel, adaptação do livro de J. R. R. Tolkien, é o que mais sofre alterações com relação à obra literária original. E, se por um lado isso pode ter aspectos positivos, por outro, apresenta algumas falhas no desenrolar da trama, no sentido de, inclusive, ir contra o 'espírito' do original.

O filme começa com o conflito entre Gandalf (Ian McKellen) e o monstro Balrog, revelando o verdadeiro destino do mago. A partir de então, o filme se divide em três linhas narrativas: Frodo (Elijah Wood), Sam, (Sean Astin) e agora também Gollum, em seu caminho a Mordor para destruir o Anel; Merry (Dominic Monaghan) e Pippin (Billy Boyd) que foram aprisionados por orcs e acabam encontrando o ent Barbárvore; e Aragorn (Viggo Mortensen), Legolas (Orlando Bloom) e Gimli (John Rhys-Davies) que, a princípio partem numa caçada para resgatar seus amigos hobbits, mas que acabam indo para Rohan, onde ajudarão o Rei Théoden e seus súditos na batalha no Abismo de Helm.

Conseguindo articular as três vertentes da história de forma coesa e fluida, Peter Jackson mostra-se um diretor eficiente. Porém, algumas alterações com relação à obra literária acabam enfraquecendo a narrativa. Acho que a mudança que mais compromete (inclusive o ritmo do filme) é aumentar a participação de Arwen (Liv Tyler). Suas aparições neste filme em nada contribuem para o andamento da história; muito pelo contrário, quebram o seu ritmo. A única justificativa que consigo enxergar para tanto, é aumentar o peso da principal personagem mulher da obra, para agradar mais o público feminino.

Essa segunda parte de "O Senhor dos Anéis" assume com mais força que seu antecessor o caráter épico da narrativa; e se antes tínhamos a história centrada mais nos personagens e em sua jornada individual (ainda que dentro da Sociedade do Anel) para que o Anel fosse transportado com segurança; agora o sofrimento deixa de ser dos personagens individualmente, e passa a ser coletivo, dos habitantes da Terra Média, que sofrem com o crescente poder de Sauron e Saruman (Christopher Lee).

Porém, isso faz com que o desenvolvimento dos personagens sejam deixados de lado em prol da ação. Assim, quando poderíamos ver Elijah Wood sobressaindo-se em sua composição de Frodo, apenas o vemos sofrendo pelo crescente peso do Anel. E assim acontece com quase todos os personagens. Sem contar aqueles que sofreram alterções bruscar em sua índole com relação ao livro, como o Rei Théoden e Faramir (este último me indignou sobremaneira); ou o fato de Gimli tornar-se apenas um alívio cômico da narrativa. Talvez somente Sean Astin destaque-se um pouco, conseguindo atribuir mais carcaterísticas a Sam do que as vistas em "A Sociedade do Anel".

Mas, se não há espaço para os personagens 'reais', o mesmo não se pode dizer de Gollum. Responsável por uma das melhores cenas do filme, Gollum demonstra ser o personagem mais complexo até esta etapa da trilogia. Isso sem mencionar a sua qualidade técnica - certamente um dos melhores personagens digitais já vistos na história do Cinema.

O que me leva a falar da parte técnica do longa, que consegue ser ainda melhor que a do seu antecessor. A batalha no Abismo de Helm, que conta com milhares de figurantes digitais, é incrível, superando a batalha vista no início do primeiro filme. E a fotografiade Andrew Lesnie continua belíssima, conferindo diferentes tons de acordo com cada lugar. Sem falar na direção de arte, que volta a se sobressair, criando novos e distintos ambientes, como Rohan (claramente inspirada em construções nórdicas) e o Abismo de Helm.

Enfim, não tão brilhante como "A Sociedade do Anel" (principalmente em função da quebra do seu ritmo e das alterações que alguns personagens sofreram em seu caráter), esse "As Duas Torres" não deixa de ser um grande filme, ainda mais porque apresenta-nos com excelência um personagem digital tão complexo. "Gollum! Gollum!"

Fica a dica!


por Melissa Lipinski


sábado, 29 de outubro de 2011

O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Senhor dos Anéis: A Sociedado do Anel, O (The Lord of the Rings: The Fellowship of the Ring, 2001)

Estreia oficial: 19 de dezembro de 2001
Estreia no Brasil: 1º de janeiro de 2002
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Lembro-me perfeitamente da emoção que senti quando assisti "A Sociedade do Anel" pela primeira vez. Depois de ter lido os livros duas vezes, era incrível como Peter Jackson tinha conseguido transpor às telas algo praticamente impossível até então. Claro que algumas alterações tiveram que ser feitas para levar às telonas a obra de J. R. R. Tolkien. Mas Jackson soube-se manter fiel ao seu conceito, modificando-a para torná-la mais cinematográfica.

Fazendo uma introdução para contar a história do Um Anel principalmente àqueles que desconhecem a obra de Tolkien (já que ela inexiste no livro), os roteiristas Jackson, Fran Walsh e Philippa Boyens conseguem fazer como que, logo no início, já saibamos da importância e da força que o Anel possui, assim como sua personalidade própria. Essa passagem já estabele o Anel como um dos personagens centrais da narrativa, colocando-o como grande vilão da história e justificando o porquê, ao longo do filme, tantos personagens sentem-se intimidados ou ansiosos por tê-lo em mãos.

Dito isso, já me vem à mente a ótima atuação de Sean Bean como Boromir, que desempenha um dos arcos dramáticos melhores estabelecidos no longa. O conflito que este personagem sente ao saber que tem o Anel por perto é tão comovente quanto revoltante (sinal da boa atuação e da identificação do espectador).

Destaca-se também a atuação do (sempre) excelente Ian McKellen, como Gandalf, que dá sabedoria e equilíbrio ao personagem - ele estabelece-se como um Yoda da Terra Média, que, por mais que aparente cansaço por sua idade avançada, sabe lutar como ninguém, além de uma calma sapiência (e por isso incomodou-me o fato de, diferentemente do livro, aqui ser Frodo, e não o próprio Gandalf, quem desvenda o enigma para entrar em Minas Moira).

Além de Bean e McKellen, gostei muito das caracterizações de Ian Holm como Bilbo Baggins (ou Bolseiro, como preferirem), que cria seu personagem tal e qual no livro (acho que foi a transposição que me pareceu mais perfeita); e Christopher Lee, que compõe um Saruman perverso e temível. Mas não só estes, todo o elenco está muito bem, e se estes chamam a atenção é porque suas histórias estão mais centradas neste primeiro filme.

Tecnicamente, "A Sociedade do Anel" também merece louvor. Desde a fotografia de Andrew Lesnie que confere um tom épico à história; a trilha sonora comovente composta por Howard Shore; os efeitos visuais convincentes; até a excepcional direção de arte, que cria ambientes tão diferentes e detalhistas quanto a imaginação pode permitir, como as pequeninas casas e os coloridos campos do Condado, a reluzente Valfenda (ou Rivendell), os amplos salões das Minas Moira, a altíssima torre de Isengard, a lamacenta Bri, onde fica a estalagem do Pônei Saltitante… Enfim, incrível é pouco para falar sobre o design de produção.

E, coroando tudo, a 'mão' acertada de Peter Jackson, que dá ritmo à narrativa, alternando com sabedoria cenas de maior tensão e ação, com outras de puro deleite e calmaria, ou de maior intensidade dramática. Além de uma incrível cena de batalha logo no início do filme.

Enfim, "A Sociedade do Anel" consegue me emocionar sempre que a revisto como se fosse a primeira vez. E, em todas ela, deixa-me ansiosa para ver a continuação desta comovente aventura de Aragorn, Frodo, Sam, Gandalf, Legolas, Gimli, Merry e Pippin.

Fica a dica!


por Melissa Lipinski


quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Senhor Tadeu

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Senhor Tadeu (Pan Tadeusz, 1999)

Estreia oficial: 22 de outubro de 1999
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Baseado em um poema épico de Adam Mickiewicz que narra o fim de uma era da aristocracia polonesa, o filme de Andrzej Wajda conserva os diálogos em verso como fio condutor da sua história.

É mais um filme onde Wajda fala sobre a história de seu país, a Polônia. Porém aqui, a trama vem em forma de fábula. Contada como um grande flashback, a história começa no interior de um apartamento na França, onde o próprio poeta Adam Mickiewicz (interpretado por Krzysztof Kolberger) narra seu conto sobre a Última Incursão Armada na Lituânia (que até 1918 fazia parte da Polônia. Vale notar que, em 1940, o país foi então anexado à antiga União Soviética, para novamente tornar-se independente somente em 1990).

A trama aristocrática lituana é uma clássica história sobre brigas de famílias, votos de vingança, personagens que se fazem passar por outros, amores separados, paixões arrebatadoras, assassinato, culpa, revelações chocantes e reconciliações em leitos de morte… Enfim, tudo o que um melodrama épico deve possuir.

Porém Wajda aposta em um lado mais engraçado para tirar o peso dramático da narrativa. E, por mais que se trate de uma história de vingança e guerra, o tom cômico impera em maior parte da narrativa.

E, se o ritmo do filme é lento no início, isso se deve em grande parte ao incômodo que os diálogos versados impõem. Mas, à medida, em que vai-se acostumando com o falar literário, o filme parece que começa a 'engrenar'.

Mas, afora seus versos, algumas situações engraçadas, e um elenco competente, mais nada em "Senhor Tadeu" realmente se sobressai. Um filme correto e curioso, mas nada além disso.


por Melissa Lipinski


quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Korczak

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Korczak (Korczak, 1990)

Estreia oficial: 6 de maio de 1990
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Muitas vezes acusado de anti-semitismo em seus filmes, a verdade é que o cineasta, Andrzej Wajda, sempre levanta a bandeira de seu país, a Polônia, em suas obras. Católico, Wajda acaba conferindo sua própria visão a temas bastante polêmicos, já que muitas vezes fala sobre a Segunda Guerra Mundial, quando a Polônia foi invadida pelos Nazistas, que ali foram responsáveis pelo Holocausto - genocídio principalmente de judeus.

Mais do que se colocar contra ou a favor, Wajda conta histórias (claro que seu viés católico polonês está embutido aí, seria impossível ignorá-lo). E assim é este "Korczak", filme de 1990, baseado em fatos reais, que conta a história do pediatra-pedagogo que dá título ao longa. Janusz Korczak tinha prestígio na sua época devido ao seu método em educação de crianças. Ele comandava, dentre outros afazeres, um orfanato para crianças judias em Varsóvia, capital polonesa. Quando ocorreu a ocupação nazista do seu país, em 1939, Korczak foi obrigado a mudar seu orfanato para dentro do Gueto de Varsóvia, e ele mesmo (um não judeu) foi junto, para não abandonar suas crianças.

Dentro do gueto, Korczak fez o que pôde para preservar as crianças do terror da guerra, mas, com a admissão de um número cada vez maior de órfãos da guerra sob sua tutela, isso tornava-se cada vez mais difícil. Korcsak utilizava-se de peças de teatro para incutir nos pequenos a ideia da morte, e o quanto isso era inevitável, para que eles se acostumassem a conviver com ela. Em 1942, o médico, seus funcionários e todas as crianças foram levadas para o campo de concentração de Treblinka. Não se sabe ao certo o que aconteceu com Korczak e suas crianças a partir daí. Oficialmente foram mortos na câmara de gás; mas diz uma lenda judia-polonesa que o vagão em que o doutor e seus pupilos estavam, misteriosamente soltou-se do comboio, e eles conseguiram fugir.

Wajda conta essa história de maneira crua e direta, sem amenizar em violência. A fotografia em preto-e-branco de Robby Müller colabora na frieza do discurso. Para dar ainda mais verosimilhança à história, Wajda utiliza-se de partes de filmes-notícia da época.

Porém, o roteiro de Agnieszka Holland está mais preocupado em mostrar o sacrifício do médico do que realmente ambientar a história e desenvolver seus outros personagens. Assim, muitos deles entram e saem de cena sem sabermos exatamente quem são (confesso que só fui entender alguns deles quando fui buscar mais informações sobre a vida do real Korczak). O próprio pediatra-pedagogo, vivido por Wojciech Pszoniak, sofre com a falta de profundidade e torna-se 'apenas' um mártir, mas não um ser humano - é alguém que se sacrifica em prol de uma causa, mas jamais conseguimos saber quem ele realmente é.

Mais do que ser anti ou pro-semita, vejo em "Korczak" a vontade de Andrzej Wajda em contar uma história de um 'herói'. Um herói judeu que não era judeu, mas que prolongou o máximo quanto pôde a vida daquelas crianças das quais cuidava. O final do longa de Wajda, a meu ver, apenas traduz o sentimento de um polonês dando voz às suas lendas, à esperança, independentemente de suas crenças religiosas.


por Melissa Lipinski


terça-feira, 25 de outubro de 2011

Mamute

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Mamute (Mammuth, 2010)

Estreia oficial: 21 de abril de 2010
Estreia no Brasil: 5 de agosto de 2011
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Com um roteiro simples travestido em road-movie, "Mamute" é tal qual seu protagonista: bizarro, simples, mas 'grande' demais.

Gérard Depardieu é Serge, um funcionário de um matadouro de porcos que está se aposentando. Mas, para garantir uma aposentadoria remunerada, terá que conseguir uns comprovantes de seus empregos anteriores. Assim, parte em busca desses papéis, cruzando o interior da França e passando por personagens tão bizarros quanto ele próprio.

Logo no início, na festa de despedida que seus colegas oferecem a Serge, os diretores Gustave de Kervern e Benoît Delépine já dão o ar que o filme vai tomar: irônico e incômodo.

O filme é mesmo de Depardieu. Sua atuação é quem dita o ritmo do longa. Por trás de um verdadeiro 'mamute', sujo e grosseiro, Serge esconde uma personalidade sensível e calejada por um acidente do passado.

Como todo road-movie, Serge vai passando por personagens e deixando-os para trás, mas cada um deles altera, a seu modo, a vida do protagonista. Junto com Serge, vai a 'memória' de sua ex-namorada, vivida pela bela Isabelle Adjani, que ajuda o protagonista a racionalizar e compreender o que lhe acontece.

Com uma estética bastante granulada (principalmente quando o fantasma da ex-namorada aparece), "Mamute" é um filme realizado com poucos recursos, o que não interfere em nada em sua narrativa, muito pelo contrário, a filmagem em Super 16 dita a estética do longa.

"Mamute" é como uma fábula triste, com situações improváveis e absurdas, personagens perturbadores (a sobrinha de Serge, Miss Ming, é um prato cheio para qualquer psicanalista), e um protagonista que, por mais patético que possa parecer, revela-se uma pessoa complexa e carente, objetiva e sentimental, contraditória como todo ser humano.

Talvez seu maior defeito seja seu ritmo, lento demais, o que faz com que seus 90 minutos passem lentamente. Mas no geral, "Mamute" é um filme sincero. Perturbado, mas sincero. E isso geralmente não agrada a muita gente.


por Melissa Lipinski


segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Contra o Tempo

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Contra o Tempo (Source Code, 2011)

Estreia oficial: 1º de abril de 2011
Estreia no Brasil: 30 de setembro de 2011
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"Contra o Tempo" é um eficiente filme de viagem no tempo. Sua estrutura circular é bem construída (algo imprescindível em um filme do gênero) e ajuda na construção e identificação com o protagonista. E o melhor: a interessante trama de ficção científica apenas serve de fundo para que o herói mergulhe em uma 'viagem' de auto-descobrimento, cruzando com personagens complexos e bem construídos ao longo de sua jornada.

Escrito por Ben Ripley, o roteiro não perde tempo apresentando personagens, já coloca o espectador (e o protagonista) dentro da trama, aumentando assim a identificação do espectador com o protagonista, já que a confusão de um espelha-se na do outro. Além disso, esse fato também transforma os diálogos explicativos entre o Capitão Colter Stevens (Jake Gyllenhaal) e a oficial Goodwin (Vera Farmiga), não só 'desculpáveis' narrativamente, mas altamente justificáveis.

Devo dizer que a estrutura circular do longa dirigido por Duncan Jones foi o que mais me agradou. Trazendo diferenças sutis a cada nova 'viagem' do protagonista, elas vão fazendo sentido dentro da trama e ajudando a nos apresentar a natureza do personagem. Mas, principalmente tornam uma narrativa, que na sua essência é simples, em algo mais intrincado e detalhista. Ainda que o final feliz (que os estadunidenses insistem em colocar em suas produções) soe um tanto quanto forçado (mas afinal, é um filme de ficção científica, e não se pode exigir verosimilhança com o mundo real se dentro da própria lógica da história ela acontecer - e acontece!).

Mas o filme funciona porque o elenco funciona bem. Jake Gyllenhaal comprova seu imenso carisma e talento, e transmite com eficiência a crescente angústia do personagem, assim como seu crescimento pessoal na sua jornada. E os detalhes da sua composição convencem-nos de que ele realmente é um militar (desde sua postura até o modo como aborda as pessoas). Junto com ele, Michelle Monaghan estabele uma ótima química, e que nos faz acreditar que aquela mulher inspiraria e daria uma maior motivação à Stevens. Já Vera Farmiga consegue transformar sua personagem em uma ser humano complexo, e que forma um contraponto importante ao frio e calculista cientista interpretado por Jeffrey Wright.

Duncan Jones consegue imprimir ao filme um ritmo acelerado, deixando sempre claro que o tempo (ou a falta dele) é um elemento primordial para a história. Além de não desperdiçar tempo com planos desnecessários - todos os elementos mostrados desde o início do longa terão sua importância reveladas no decorrer da história. Assim, juntamente com seu montador, Paul Hirsch, o diretor conseguiu um filme ágil e que jamais se torna repetitivo, por mais que revejamos a mesma cena diversas vezes.

Contando ainda com uma belíssima cena em seu final, "Contra o Tempo" não é só diversão com conteúdo; mas um excelente exemplar de ficção científica.

Fica a dica!


por Melissa Lipinski


domingo, 23 de outubro de 2011

Conflito Mortal

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Conflito Mortal (Wong Gok Ka Moon, 1988)

Estreia oficial: 9 de junho de 1988
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Este primeiro longa do hoje renomado diretor chinês Wong Kar-Wai é bastante irregular, e alterna cenas bastante inspiradas, com outras mais burocráticas - momentos desinteressantes.

A estética que Kar-Wai emprega é típica dos anos 1980, com uma atmosfera vibrante e colorida, mostrando uma Hong Kong habitada por gangues e repleta de luzes neon e becos esfumaçados, misturada com famílias tradicionais chinesas.

Com uma história que fala sobre honra dentro de um submundo das gangues de rua e jogos ilegais, e de um amor improvável entre primos, tudo parece meio piegas.

Mas o grande diferencial de "Conflito Mortal" certamente é sua fotografia. Wong Kar-Wai retrata as ruas de Hong Kong com tamanho realismo, filmando perseguições e brigas de rua com uma câmera frenética, o tempo todo em movimento. Há cenas em que os sentimentos do protagonista realmente 'tomam a cena', e vemos certas cores predominando, como na sequência em que o protagonista, Wah (Andy Lau), vai vingar a surra que seus irmãos mais novos levaram, e, durante a briga, o azul toma conta da cena, assim como enquadramentos com ângulos pouco usuais, como que externalizando a sua raiva.

E são justamente nas cenas em que os sentimentos do protagonista, seja com apelo romântico ou violento, são exacerbados, é que vemos a 'mão' do diretor que viria a se tornar um dos mais respeitados do cinema 'cult'; como se, na abstração, Kar-Wai conseguisse 'se encontrar' mais do que no 'realismo'. E não é por acaso que Wong Kar-Wai intercala as cenas de romance com as de maior violência. É como se já desde o primeiro indício de romance entre o protagonista e sua prima Ngor (Maggie Cheung), o diretor já prenunciasse o seu destino infeliz.

Destino infeliz, aliás, é justamente uma das marcas do melodrama, que tanto influencia o diretor chinês - o amor impossível, o sacrifício, a estética 'over', a música como ênfase dos momentos mais dramáticos - todas características do melodrama que Kong Kar-Wai se utliza. Porém, o cineasta lança um novo olhar sobre o gênero, já que parece não acreditar no 'sentimento-base' do melodrama: o amor. E assim, Kar-Wai o desconstrói, já que seus personagens parecem sempre vagar sem nunca alcançá-lo (e esse é um sentimento que vai aparecer mais forte em toda sua posterior cinematografia).

Enfim, "Conflito Mortal" foi o primeiro longa do diretor, e, se não possui uma regularidade em sua totalidade, acaba se beneficiando de belos momentos pontuais - como a primeira cena de romance entre Wah e Ngor; ou a briga que citei - onde Wong Kar-Wai utiliza-se de cores fortes e ângulos diferenciados, já dando indícios do excelente cineasta que viria se tornar.


por Melissa Lipinski


quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Um Conto Chinês

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Conto Chinês, Um (Un Cuento Chino, 2011)

Estreia oficial: 24 de março de 2011
Estreia no Brasil: 2 de setembro de 2011
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Ricardo Darín, como já disse aqui no blog outras vezes, é um dos meus atores favoritos. Acho que ele sabe dar vida a cidadãos comuns de maneira surpreendentemente realista. Aqui, neste "Um Conto Chinês", há mais uma prova desta sua 'marca'.

O filme escrito e dirigido por Sebastián Borensztein gira em torno de Roberto (Darín), um ferrageiro que mantém uma vida hermética, metódica, extremamente solitária e melancólica. Além de cuidar de sua loja, ele ocupa seu tempo procurando notícias fantásticas, absurdas sobre acidentes do acaso, como a espetacular cena de abertura do longa, onde uma vaca, na China, literalmente cai do céu sobre um pequeno barco onde um rapaz está prestes a pedir a mão da sua noiva em casamento. O que Roberto mal pode esperar é que justamente um desses acasos da vida fará com que ele reavalie toda a sua existência.

Baseado em diálogos rápidos e ácidos, o roteiro aposta sua graça tanto nesses diálogos como no choque entre diferentes costumes e na incomunicabilidade entre um argentino que só fala castelhano e um chinês que só fala mandarim.

Acho que o ponto fraco do roteiro é transformar o personagem Jun (Ignacio Huang) em uma muleta que serve apenas para ser o alívio cômico da trama. Transformado em uma caricatura, o personagem serve apenas para que o personagem de Darín possa percorrer a sua transformação, o seu arco dramático; e jamais é considerado como um personagem tridimensional. O fato de suas falas (em mandarim) não serem traduzidas (legendadas), é o principal fator desta estereotipização.

Assim como todo filme 'positivo' (os "feel good movies"), as situações são criadas afim de que os personagens possam sofrer transformações que os melhorem, os façam felizes, e consequentemente, pela identificação, também façam os espectadores felizes. E "Um Conto Chinês" não traz nada de novo ou especial neste quesito. O grande mérito do diretor é fazer com que o protagonista realmente pareça real, e portando, suas dores, angústias, e também seus sucessos e felicidade soam autênticos e verdadeiros.

E isso graças ao talento espetacular de Ricardo Darín (sim, não me canso de elogiá-lo), e também ao contraponto da personalidade de seu personagem com as dos outros personagens, tanto com a espontaneidade de Jun, quanto com o amor de Mari (Muriel Santa Ana).

A escolha do diretor (e roteirista) em não traduzir as falas de Jun também tornam-se um ponto positivo do longa, por mais contraditória que eu possa parecer. Pois esse fato mostra que não é preciso entendermos o que se está falando para compreendermos o sentimento, a emoção transmitida pelo filme, e a cena em que Jun fala ao telefone, no ápice emocional do longa, é a prova inconteste disso.

Contando ainda com uma meticulosa direção de arte - a casa de Roberto é um festival de lembranças e recordações; e uma belíssima fotografia; destaca-se também a trilha musical, muito bem escolhida.

Enfim, "Um Conto Chinês" é mais um ótimo exemplar do cinema argentino, que dialoga diretamente com o público, mesmo que para tanto, utilize-se principalmente de palavrões, idiomas desconhecidos e silêncios... Afinal, o que é a vida senão essa sucessão de acasos, contradições, caos e felicidade?

Fica a dica!


por Melissa Lipinski


quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Insolação

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Insolação (2009)

Estreia oficial | no Brasil: 26 de março de 2010
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"Insolação", filme dirigido pelo consagrado diretor teatral, Felipe Hirsch (que pela primeira vez se aventura no cinema) e por Daniela Thomas (usual colaboradora de Walter Salles na direção de seus filmes, como "Linha de Passe", "O Primeiro Dia" e "Terra Estrangeira"), é uma poesia, e como tanto, não se pode tentar entendê-lo com a razão, mas sim senti-lo.

Baseado em contos da literatura russa (os nomes dos personagens deixam isso bem claro) que falam sobre o amor, o roteiro assinado por Will Eno e Sam Lipsyte não pode facilmente ser traduzido em um sinopse reducionista. Diversos personagens passam pela cena declamando frases desconexas, ou então enfrentando, cada um a seu modo, a solidão e a incansável busca por um amor inatingível, seja através do primeiro amor platônico, ou o sexo insaciável, ou o simples afeto de alguém próximo.

A narrativa que não segue nenhum lógica cronológica ou temporal também coloca em evidência o quão perdidos são aqueles personagens. Dias e noites se intercalam sem sabermos quanto tempo se passou. Os personagens não trocam de roupas, possuem um só figurino. Vão e vêm pelas ruas e se encontram em um quiosque abandonado, onde parecem ser orientados por uma espécie de diretor (Paulo José), que fala profundas frases sobre a vida.

As atuações e a fotografia são o âmago do filme. E, assim como um poema concretista, a forma e o conteúdo se confundem. As belíssimas locações geométricas (em uma Brasília esvaziada de vida), belíssimamente enquadradas pela câmera de Mauro Pinheiro Jr., colocam-se também como personagens. Da mesma forma como oprimem as figuras humanas, que aparecem minúsculas frente a verdadeiros monumentos de concreto, em enquadramentos que colocam o homem como um ser insignificante, impotente.

Os diálogos sem conexões ou sentidos, e notadamente teatrais, reforçam o sentimento de solidão e confusão que os personagens se encontram. Na verdade, o que esses personagens falam interessa menos do que aquilo que eles aparentam sentir. É o sentimento de desamparo e de isolamento que tornam todos eles como 'zumbis' herméticos e obscuros. E, embora todos, em um momento ou outro, estabeleçam relações ou conexões entre si, na realidade estão todos sozinhos, em busca de um sentimento (amor, afeição, carinho, ou como queiram chamar) que jamais encontrarão, pois são, eles mesmos, esvaziados de qualquer sentimento.

O elenco (cujas atuações beiram a teatralidade, como falei) está irretocável. Paulo José, Simone Spoladore e Leonardo Medeiros são dos atores mais talentosos que o cinema nacional tem hoje em dia. Maria Luíza Mendonça e Leandra Leal também são ótimas atrizes. E há ainda os jovens Antonio Medeiros e Daniela Piepszyk que não ficam atrás.

Há ainda a belíssima trilha musical de Arthur de Faria, que tranquila, opõe-se aos sentimentos não exteriorizados dos personagens, criando um interessante contraponto.

Enfim, "Insolação" é uma obra importante no atual cenário do cinema brasileiro, já que abre caminho para que mais obras abstratas, 'de autor', intimistas, 'de arte' (ou como queiram chamar) venham por aí. Com certeza não é um filme fácil, e definitivamente não agradará nem um pouco àqueles que não conseguem se libertar do cinema narrativo hegemônico. Mas, para aqueles que se deixarem levar por sua beleza visual e incômoda narrativa, certamente será um experiência única.

Fica a dica!


por Melissa Lipinski


terça-feira, 18 de outubro de 2011

De Volta para o Futuro III

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

De Volta Para o Futuro III (Back to the Future Part III, 1990)

Estreia oficial: 25 de maio de 1990
Estreia no Brasil: 3 de agosto de 1990
IMDb



Assim como acontecia do primeiro para o segundo filme, esta derradeira parte da trilogia "De Volta Para o Futuro" também tem início exatamente onde o seu antecessor parou.

Reza a lenda que Robert Zemeckis sempre tivera a vontade de dirigir um western, e por isso, ele e Bob Gale resolveram fazer desta segunda continuação da saga de Marty McFly um filme do gênero. Assim, o ritmo deste longa deixa de ser frenético como nos anteriores, e passa a se parecer mais com os dos clássicos do gênero. Clássicos estes, que "De Volta Para o Futuro III" homenageia em pequenos detalhes, como a maneira com que 'Doc' Brown aparece pela primeira vez, o manto marrom que Marty usa em 1855 e o modo como ele arranja para se safar do duelo com 'Mad Dog' Tannen - todos referências à Trilogia dos Dólares, de Sérgio Leone; ou então a própria cidade de Hill Valley que, agora em 1855, abandona um pouco o visual já tão conhecido por nós, espectadores (claro que o imponente prédio com o relógio está lá. Em construção, mas está lá), e lembra um pouco as cidadezinhas de alguns filmes dirigidos por John Ford (eu me lembrei de "Rastros de Ódio" e "No Tempo das Diligências").

Ainda em questão a referências, o longa volta a apostar nas gags que deram certo no primeiro filme, e tornaram-se 'marca registrada' no segundo, como Marty acordando ao lado de sua mãe (ou, agora, uma antepassada dos McFly, Maggie, também interpretada por Lea Thompson - e aproveito o parênteses para dizer que, a meu ver, esse é um pequeno 'furo' do roteiro, já que McFly é o sobrenome do pai de Marty, e não o da sua mãe, que é Lorraine Baines) e falando que teve um pesadelo; uma perseguição que faz com que o vilão da vez, agora 'Mad Dog' Tannen, que obviamente é antepassado de Biff (e interpretado por Thomas F. Wilson), acabe com a cara no esterco; e uma maquete que 'Doc' constrói para explicar como farão a viagem no tempo.

Aliás, muitas pistas do que acontece neste filme são dadas no segundo longa (afinal, foram filmados concomitantemente), como Marty vencendo um jogo de atirar de fliperama em 2015; a menção ao antepassado de Biff no vídeo da entrada de seu prédio no 1985 alternativo; 'Doc' dizer que ia se dedicar a estudar o outro grande enigma do universo - as mulheres; e estes são apenas os mais óbvios.

Bom, como não poderia deixar de ser, assim como nos dois longas anteriores, o elenco está afinadíssimo. E, se Michael J. Fox continua com seu carisma inquestionável. Christopher Lloyd tem mais tempo para desenvolver um outro lado do Dr. Emmett Brown que até então não conhecíamos, que além de apaixonado pela professora Clara Clayton (Mary Steenburgen), também aparece mais introspectivo e contido do que antes.

Robert Zemeckis volta a demonstrar primazia na direção das cenas de ação, estendendo o tempo dramático para que a apreensão e a angústia do espectador se prolonguem por mais tempo, mas sem exagerar demais afim de ficar cansativo.

Finalizando uma história que teve início no segundo filme (ou até mesmo no primeiro), este longa fecha com chave de ouro a trilogia "De Volta Para o Futuro", transformando-a numa das mais (senão a mais) consistentes sagas da história do Cinema. E já é com imensa nostalgia que encerro esse texto. Quem sabe no futuro não volto a mais uma aventura do meu passado (sim, não resisti ao trocadilho…) para reaver os tão queridos Marty McFly e 'Doc' Brown? Enfim, imperdível!

Fica a dica!


por Melissa Lipinski


segunda-feira, 17 de outubro de 2011

De Volta para o Futuro II

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

De Volta Para o Futuro II (Back to the Future Part II, 1989)

Estreia oficial: 22 de novembro de 1989
Estreia no Brasil: 14 de dezembro de 1989
IMDb



"De Volta Para o Futuro II" deu um nó na minha cabeça quando o assisti ainda criança. Mas a trama, que na época, me parecia tão complicada, nem é tanto assim, basta um pouco de atenção para conseguir acompanhar as aventuras de Marty McFly e 'Doc' Brown.

Vou resumir: o filme retoma exatamente onde o primeiro parou, com 'Doc' Brown (Christopher Lloyd) voltando do futuro para levar Marty (Michael J. Fox), e Jennifer - agora interpretada por Elisabeth Shue - afim de não deixarem o filho destes se meter em confusão. Porém, quando estão no futuro, o velho Biff (Thomas F. Wilson) rouba o DeLorean para voltar para 1955 e entregar à sua versão jovem uma revista que contém todos os resultados de jogos de 1950 a 2000, para que este se torne milionário. Quando Marty e 'Doc' voltam para 1985, se deparam com um presente alternativo, onde Biff (agora milionário) é o dono de Hill Valley e casado com a mãe de Marty, Lorraine (Lea Thompson), e onde o pai de Marty, George, fôra assassinado. Para resolver esse problemão, 'Doc' e Marty têm que voltar justamente para a noite do baile de formatura de seus pais - aquela do primeiro filme - que foi justamente quando o Biff velho entregou a revista para o jovem Biff. Assim, Marty tem que reaver a revista e, ao mesmo tempo, evitar encontrar-se com sua outra versão (a do primeiro filme) que também está em 1955. Ah, nem é tão complicado assim, não é mesmo?

O roteiro, novamente de autoria de Robert Zemeckis e Bob Gale, aposta em situações que remetem à algumas do longa original, como Marty acordando com sua mãe ao lado (agora em um 1985 alternativo) e falando que teve um sonho estranho; ou na cena onde ele foge de Biff - ou melhor, Griff - e seus capangas pelo centro de Hill Valley (agora em 2015), utilizando desta vez um skate voador, tanto que o velho Biff (que presencia a cena) comenta: "isso me parece familiar". São associações que fazem uma releitura do primeiro filme, fazendo graça e atualizando piadas que já funcionaram, de maneira criativa. Assim, já que não teriam mais o ineditismo da ideia de viajar pelo tempo, os roteiristas abusaram das auto-referências e de uma dose ainda maior de ação.

Os efeitos visuais deste segunda longa voltam a ser excepcionais, assim como a maquiagem dos atores; e assim, a cena em que Michael J. Fox interpreta três personagens (o Marty envelhecido, seu filho e sua filha) em um mesmo plano é extremamente convincente. Aliás, Zemeckis e Gale abusaram do recurso de colocar o mesmo ator em um mesmo plano, assim vemos Michael J. Fox como a sua família de 2015; o Biff de 2015 contracenar com seu neto, Griff (também interpretado por Thomas F. Wilson); o Biff de 2015 e o Biff de 1955; o Doutor Brown de 1985 e o de 1955; assim como as duas versões de Marty de 1985 que estão em 1955.

Novamente como no longa original, as mudanças sofridas na cidadezinha de Hill Valley são um charme à parte. E, mais uma vez, tomando-a como um personagem do filme, vemos que o ar sombrio que adquire no 1985 alternativo muda toda a estética do filme. Assim como seu deisgn futurista em 2015.

Mais uma vez o elenco aparece inspirado, sendo que Michael J. Fox é o 'dono' absoluto do longa. Christopher Lloyd também se destaca com suas caras e bocas.

Enfim, Robert Zemeckis dirige uma continuação à altura do primeiro longa, e já dando pistas para sua continuação seguinte (na época, os filmes foram gravados simultaneamente). Imperdível!

Fica a dica!


por Melissa Lipinski


domingo, 16 de outubro de 2011

De Volta para o Futuro

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

De Volta Para o Futuro (Back to the Future, 1985)

Estreia oficial: 3 de julho de 1985
Estreia no Brasil: 29 de dezembro de 1985
IMDb



"De Volta Para o Futuro" foi o filme da minha infância, nem sei quantas vezes o assisti. E, numa onda de ver (e rever) sagas e trilogias, nos deparamos com este clássico. Sempre há aqueles filmes que adoramos quando somos crianças, mas quando o revemos, já adultos, nos decepcionamos. Este, com certeza, não é um deles. Revisitá-lo depois de um bom tempo foi, digamos, revigorante. E não apenas reacendeu antigas lembranças e sensações, como confirmou, definitivamente, que esse é um grande filme de aventura.

Bom, a sinopse descarta (re)apresentações, não é mesmo? O roteiro escrito pelo próprio Robert Zemeckis (o diretor) e Bob Gale, é extremamente hábil em lidar com a fórmula circular que a viagem no tempo proporciona. E é recheado de pormenores, sutilezas, detalhes que você vai (re)descobrindo a cada nova assistida.

Como diz o próprio Gale nos extras do DVD, a ideia surgiu da curiosidade de que todos nós temos em saber como eram nossos pais na juventude. Será que eles realmente não faziam certas coisas, ou apenas dizem que não faziam? E acho que é essa curiosidade, que mexe com a maioria das pessoas, o que torna o longa produzido por Steven Spielberg tão bem sucedido. E assim Marty McFly acaba tornando-se uma espécie de 'alter ego' de cada espectador. Nós nos identificamos com ele, torcemos por ele, sofremos por ele… Enfim, fazemos nossas as suas angústias, nervosismo e aventuras.

E a as cenas de ação são extremamente bem conduzidas por Zemeckis. Mas "De Volta Para o Futuro" não é só aventura, e acerta a mão também na sua dose de comédia, repleta de diálogos bem construídos e afiados.

Tecnicamente até hoje os efeitos são eficientes. A trilha musical também é um dos pontos altos, funcionando não só com a música-tema ("The Power of Love", de Huey Lewis) mas principalmente com a música incidental de Alan Silvestri, extremamente empolgante. Mas o encanto de "De Volta Para o Futuro" é mesmo seu design de produção, seja na concepção da máquina do tempo com o imortalizado DeLorean; seja na charmosa cidadezinha de Hill Valley. E, novamente aqui, afirmo que, a cada vez que reassisto ao filme, noto um detalhe a mais, uma sutileza da equipe de Arte. A pequena cidade é como se fosse mais um personagem do filme, tamanha a sua importância.

Mas certamente o filme não teria o mesmo charme se não fosse pela escolha de seu elenco. Michael J. Fox empresta a jovialidade certa e o carisma inegável ao jovem Marty McFly. Christopher Lloyd imortalizou e reinventou o conceito de cientista maluco com seu Emmett 'Doc' Brown. Thomas F. Wilson, como Biff, não poderia compor um vilão mais vil e rabugento. Lea Thompson acerta tanto na composição da ousada jovem Lorraine Banes, como na sua versão 30 anos mais velha, alcoólatra e desgostosa com o casamento. Mas é Crispin Glover que mais se destaca como George McFly, seja em sua versão de fracassado pai de família, ou de jovem nerd, ou ainda, ao final, de jovial escritor.

Enfim, "De Volta Para o Futuro" é daqueles filmes que não envelhecem. Para se assistir inúmeras vezes e, a cada um delas, se deliciar como se fosse a primeira vez, fazendo novas descobertas. Imperdível!

Fica a dica!


por Melissa Lipinski
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Filme de toda uma geração. Assisti muito esse filme quando criança e definitivamente é um filme que não me canso de assistir.

Neste primeiro filme da saga nós conhecemos as personagens e vamos criando um apego aos dois principais: Marty McFly e o Dr. Brow. Por mais científico que sejam alguns diálogos, os termos conseguem abranger um grande público. Mas vamos às áreas:

Fotografia e Arte. Bela composição. Recriando a cidade nos anos 1950 e depois retratando a mesma num estado mais degradado nos anos 1980. Muito bem feita.

Personagens e Elenco: A escolha foi excelente. Todos estão muito bem no filme. Além dois dois principais (Michael J. Fox e Christopher Lloyd) faço destaque para Crispin Glover, que interpreta o pai de Marty. Muito boas todas as cenas dele no filme.

O roteiro é muito bem escrito, desenvolvido e dirigido. Quem não gostaria de voltar no tempo e saber se alquelas histórias que nossos pais nos contam é totalmente verdade? Conhecer in loco a cultura e a realidade de 30 anos atrás. Junte a isto várias confusões da época de escola. Muito bom.

Recomento muito, muito, mas muito mesmo.


por Oscar R. Júnior


sábado, 15 de outubro de 2011

Os Outros Caras

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Outros Caras, Os (The Other Guys, 2010)

Estreia oficial: 6 de agosto de 2010
Estreia no Brasil: 26 de novembro de 2010
IMDb



Não se pode exigir coerência e um roteiro sem furos de filmes de Adam McKay. Basta olhar para sua filmografia, que vai desde o hilário "O Âncora: A Lenda de Ron Burgundy" (2004), passando pelos fracos "Quase Irmãos" (2008) e "Ricky Bobby - A Toda Velocidade" (2006); e certamente seus melhores trabalhos, as sketchs para a internet "Good Cop, Baby Cop" e "The Landlord" (ambos de 2007 e protagonizados por Will Ferrell e pela filhinha de McKay). Para assistir seus filmes, há que se deixar o cérebro 'de molho' e se permitir fruir da comédia non-sense pura e simplesmente, sem preconceitos ou pudores.

O roteiro (co-escrito por McKay e Chris Henchy) nem precisa ser descrito, pois a trama é o que menos importa aqui. A sucessão de piadas absurdas e gags visuais a uma velocidade alucinante é o que segura o filme. Uma situação cômica engatada na outra faz com que o espectador não pare de rir (seja em maior ou menor grau) e não pare para dar atenção à história.

Claro que as piadas nem sempre acertam, e por vezes soam sem graça nenhuma. Mas na maioria das vezes funcionam, seja parodiando os clássicos filmes de ação 'nitroglicerinados' com a dupla interpretada por Samuel L. Jackson e Dwayne Johnson; seja no improviso de Will Ferrell; nas impetuosas crises de raiva do personagem de Mark Wahlberg; ou ainda nos momentos em que Eva Mendes surge em cena com sua boa química com a dupla principal.

Aliás é exatamente na química entre os dois protagonistas, Ferrell e Wahlberg, que reside a única razão para o longa não cair no desastre total. Fazendo os estereótipos de policial nerd que transparece tal conduta para incobrir uma personalidade descontrolada, e de policial nervosinho e machão que esconde um lado mais sensível, respectivamente, Ferrell e Wahlberg, mostram-se à vontade. Não que seja surpresa ver Ferrell num papel assim, afinal já interpretou-o tantas vezes; mas ver Wahlberg sair-se bem em uma comédia non-sense é uma surpresa (pelo menos para mim).

Mas enfim, "Os Outros Caras", longe de ser um bom filme, é uma comédia policial que diverte pelo absurdo. Não tente entender as soluções logicamente - pois dessa forma, jamais poderá usufruir o que esse filme tem de melhor, que é exatamente a falta de sentido em suas situações. E, sim, eu jamais pensei que diria isso… Mas às vezes é bom apenas sentar e se deixar levar e sorrir pelo humor pura e simplesmente.


por Melissa Lipinski


sexta-feira, 14 de outubro de 2011

O Filho da Noiva

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Filho da Noiva, O (El Hijo de la Novia, 2011)

Estreia oficial: 16 de agosto de 2001
Estreia no Brasil: 22 de novembro de 2002
IMDb



Segunda parceria entre o diretor Juan José Campanella e o ator Ricardo Darín, este "O Filho da Noiva" é um belíssimo drama argentino que, como pano de fundo, aborda questões importantes como o mal de Alzheimer, a crise econômica argentina e a 'pendenga' entre capitalismo e humanismo.

O roteiro do próprio Campanella e de Fernando Castets prima por colocar as relações humanas em primeiro plano, e conta um complicado período da vida de Rafael (Darín), um estressado dono de restaurante que, por causa da crise econômica, está sofrendo pressão para vender seu estabelecimento para uma grande major internacional. Junto a isso, tem que lidar com namorada Naty (Natalia Verbeke); a filha Vicky (Gimena Nóbile); a ex-mulher Sandra (Claudia Fontán); um amigo de infância insistente, Juan Carlos (Eduardo Blanco, também assíduo colaborador de Campanella); e claro, os pais, Nino (Héctor Alterio) e Norma (Norma Aleandro), que depois de muitos anos de casamento, resolvem oficializar a união na igreja.

Sutil e delicado ao retratar a doença de Norma, o mal de Alzheimer, Campanella acerta a mão na dose de melodrama que impõe à narrativa, assim como o equilíbrio com momentos mais engraçados. A base melodramática da história é quebrada por momentos de humor cínico e ferino, e dessa forma, o espectador transita do riso às lágrimas naturalmente.

Porém, assim como os demais trabalhos do diretor, a história só se complementa com a atuação. E que atuação! Darín comprova que sabe fazer o mais difícil, dar vida a homens comuns de maneira tão realista. Com seu sorriso meio cínico, seu falar rápido e seu jeito de 'boa gente', Darín parece ser um homem 'qualquer', que você poderia conhecer ou passar por ele na rua. E isso, tenho certeza, não é tarefa fácil. Já a dupla Alterio-Aleandro (do excepcional "A História Oficial", primeiro longa argentino a vencer o Oscar de melhor filme estrangeiro, em 1986) emociona pela simplicidade de seus personagens. Norma Aleandro, em especial, compõe sua própria Norma de maneira delicada, e retrata de forma espetacular uma mulher que sofre com um início do Alzheimer, com seus olhares distantes e vazios, sua infantilidade, uma certa mania de pegar tudo que encontra pela rua (seja lixo ou pertences de outras pessoas). E quem já passou pela doença se emocionará ainda mais pela identificação com as situações.

Mas o que o filme traz de melhor é a sutil maneira como encara a vida, uma constante entre preocupações e relaxamentos, alegrias e tristezas. Escrevendo assim pode até parecer que é fácil ou comum. Mas não é sempre que se vê um filme tão simples e tão cativante. Campanella é campeão nisso. E, assim como em seu longa anterior "O Mesmo Amor, a Mesma Chuva", coloca essa história trivial sobre um pano de fundo político-econômico. Assim, quando um personagem responde a um questionamento dizendo: "mas quando é que não estivemos em crise [econômica]?", nós brasileiros (igualmente aos argentinos), entendemos muito bem como é essa realidade. Isso dá força à narrativa, e reitera o caráter realista do filme, ao mesmo tempo em que faz uma crítica social de forma discreta, sem levantar panfletos ou ser partidário.

Contando ainda com um quê de metalinguagem em sua história (há uma discussão entre dois personagens durante a gravação de uma cena de um filme; e uma reconciliação amorosa que se vê a partir de uma câmera de segurança de um edifício), "O Filho da Noiva" é engraçado, comovente, cativante e o que é melhor, te faz pensar sobre a vida. E não é isso que todo bom filme deveria fazer?

Fica a dica!


por Melissa Lipinski


quinta-feira, 13 de outubro de 2011

A Hora da Estrela

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Hora da Estrela, A (1986)

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"A Hora da Estrela", primeiro longa roteirizado e dirigido por Suzana Amaral, é uma adaptação do livro homônimo de Clarice Lispector. Possui certas modificações e liberdades artísticas em relação à obra literária, principalmente no sentido de deixar a história mais enxuta e 'cinematográfica'; mas mantém o seu espírito.

O roteiro de Amaral tem um lado mais crítico socialmente, com um olhar delicado, porém ácido, sobre as desigualdades sociais e a migração nordestina para a capital paulista. A história conta como Macabéa (Marcelia Cartaxo), migrante nordestina, sobrevive em São Paulo, trabalhando como secretária e dividindo um quarto com mais quatro moças em uma pensão suburbana. Dividindo seu dia-a-dia entre o recém conhecido namorado, Olímpico de Jesus (José Dumont), e o trabalho, onde convive com Glória (Tamara Taxman), Macabéa vai levando sua vida quase miserável.

Com uma estética 'crua', quase documental, a câmera de Edgar Moura persegue a protagonista em seu cotidiano. Notadamente influenciada pelo neorrealismo italiano (movimento cinematográfico das décadas de 1940 e 1950), a trama centra-se numa personagem 'do povo', com dificuldades econômicas, e o fato de ser nordestina também conecta-a com outro movimento, o Cinema Novo, que também preocupava-se em enfocar, dentre outras temáticas, a figura marginalizada dos nordestinos em busca de uma nova vida na cidade grande, fazendo um forte comentário sobre sua implicações sociais.

Suzana Amaral não critica explicitamente a sociedade, mas o faz de forma subliminar, discretamente. Não em diálogos ou imagens de denúncia, mas na bela composição de seus quadros, com a escolha de suas locações, objetos de cena e figurinos. No comportamento da protagonista, que se opõe aos demais. Enfim, tudo é muito sutil.

Ao colocar uma protagonista totalmente apática em cena, Clarice Lispector - e também Suzana Amaral - deixam ao público as 'tomadas de decisões'. Cabe ao espectador unir os pontos, sentir, pensar a respeito, enfim, refletir sobre a história. No fundo, "A Hora da Estrela" é uma história de amor, imperfeito e trágico é verdade, mas amor...

E o mais bonito de tudo isso, embora o ritmo do filme seja irregular e, por vezes, acabe prejudicando a narrativa, é que por mais miserável que achemos Macabéa, por mais que sintamos pena dela, também acabamos por nos identificar, e torcemos por ela. Por mais que saibamos que de nada adianta… É o famoso pessimismo de Lispector que faz-se também presente na obra de Amaral.


por Melissa Lipinski



quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Meu País

ATENÇÃO: O texto pode conter citações sobre o desenrolar do filme. Caso não tenha visto o filme ainda, tenha cuidado ou o leia após assisti-lo.

Meu País (2011)

Estreia oficial | no Brasil: 7 de outubro de 2011
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"Meu País" é o segundo longa de André Ristum, mas o primeiro a ser ficcional (o outro é um documentário, "Tempo de Resistência", de 2003). É um filme delicado, que trata de difíceis relacionamentos entre irmãos.

O roteiro, que Ristum co-escreveu com Marco Dutra e Octavio Scopelliti, é narrado sob o ponto de vista de Marcos (Rodrigo Santoro), filho mais velho de Armando (José), e que, vivendo na Itália como cidadão italiano, é casado com a filha de seu chefe. Forçado a voltar ao Brasil depois da morte de seu pai, Marcos se vê obrigado a colocar em ordem os negócios da família, que estão em risco devido ao vício por jogos de seu irmão Tiago (Cauã Reymond). Além do tumultuado relacionamento entre os dois irmãos, ambos ainda se vêem frente a um novo desafio: conviver com a recém descoberta meia-irmã, Manuela (Débora Falabella), fruto de um caso extraconjugal de seu pai e que tem a mentalidade de uma criança de nove anos.

A trama vai se desenvolvendo aos poucos. E as informações sobre os laços e problemas familiares entre os protagonistas vai sendo dada ao espectador não somente por diálogos, mas também por ações ou objetos vistos em cena. Aliás, o design de produção do filme é extremamente cuidadoso aos detalhes e bem feito. Todos os objetos vistos em cena tem um porquê, e parecem estar repletos de história e significados.

A história, apesar de ser conduzida pela ótica de Marcos, dispende tempo suficiente para que todos os personagens principais sejam bem desenvolvidos. E é justamente nesse cuidado com seus protagonistas que a história cresce. Os personagems vistos aqui não são meros artifícios do roteiro, mas sim tornam-se humanos, tridimensionais, com suas qualidades e defeitos.

Mas eles nada seriam sem seus atores. Para começar a expressiva participação de Paulo José (que considero um dos melhores atores brasileiros) e que, mesmo com poucos minutos em cena, consegue transmitir a sensação de arrependimento, remorso, de coisas não ditas, coisas não realizadas. Rodrigo Santoro surge contido, demonstrando seus sentimentos apenas com pequenos olhares, mas na maioria do tempo, impassível; e, se Cauã Reymond está apenas correto; é Débora Falabella quem se destaca numa composição delicada e tocante, que emociona principalmente quando está em cena com Santoro.

Embora a história se desenvola e foque-se em seus personagens, nem tudo é explicado em seus pormenores, deixando lacunas para que o próprio espectador as preencha. E o plano final (belíssimo), não traz respostas, e deixa em aberto para que cada espectador defina o destino de seus protagonistas.

Belíssima também é a fotografia de Hélcio Alemão Nagamine, com cores dessaturadas e um branco levemente estourado, que parece refletir o desgaste daqueles laços familiares. O uso de teleobjetivas que fecham os enquadramentos e desfocam o fundo condiz maravilhosamente bem com o sentimento que Ristum quer passar, o de isolamento, sufocamento - os irmãos estão ligados uns aos outros, mas não se conectam, cada um é uma ilha, ou seu próprio país, como o título se refere. E Marcos, um estrangeiro que vive na Itália, parece sentir-se da mesma maneira em seu próprio país e em sua própria família. Faz-se necessária a inocência (da deficiência) da irmã para despertar-lhe o mínimo de afeto. São personagens perdidos em seus sentimentos, em seus remorsos, suas frustrações.

Enfim, "Meu País" é um filme que trata de difíceis temáticas de forma delicada, inteligente e extremamente bela. Um longa que tem mais significados em seus silêncios do que em suas palavras, e o poético plano final prova isso maravilhosamente bem. Uma ótima estreia de Ristum!

Fica a dica!


por Melissa Lipinski